Essa é a história do Ian e do Carlos. O Ian que era um rapaz
que tinha acabado de completar seu ciclo e o Carlos que estava apenas se
descobrindo. Eu conheci o Ian muito tempo atrás, ele ainda não tinha descoberto
nada do que estava para acontecer na sua vida.
Seu nome ainda era outro.
Ele ainda não tinha descoberto se gostava de homens ou de
mulheres quando o conheci, na realidade, nem pensávamos em nada disso, éramos
crianças ainda. Nossos jogos preferidos eram: queimada, varetas, damas e
polícia e ladrão. Crescemos juntos: mesma rua, mesmos amigos, mesma escola. O
Ian foi para uma faculdade no interior e eu fiquei por aqui mesmo. Eu fazia
faculdade particular, era bastante caro, mas eu consegui um desconto e dava
para trabalhar e pagar tranquilamente. Ficava o dia todo fora. Terminei o
curso, foi muito tranquilo. O Ian também se formou e retornou para a casa dos
pais, foi aí que nos reencontramos.
Ele já estava completamente diferente, roupas, cabelo,
barba. Ainda faltavam alguns detalhes para sua transição, porém já era um homem
formado. Fiquei com inveja, não mudei e nem evoluí nada, achei meio estranho e
até me envergonho disso hoje em dia. Fui até a casa dele, para saber as
novidades, como tinha sido lá no interior e enfim matar as saudades.
Ele me atende, bastante feliz com a minha presença. Fomos
conversando sobre todas as conquistas dele, como foi o curso, quem ele conheceu
durante a estadia em outra cidade, detalhes que eu desconhecia por que havíamos
nos afastado e perdido o contato. E chegou o assunto final: amor.
Na adolescência eu e o Ian estávamos descobrindo muitas
coisas, acabamos nos envolvendo por um curto período de tempo. Eu hoje me
assumi lésbica, minha família não aceitou no início, tiveram muitas brigas,
inclusive com o Ian também. Mas hoje, felizmente, aceitam. Mas acontece que o
Ian foi para um caminho diferente, durante o período que estava na faculdade,
conheceu outros garotos, se interessou, ficou confuso e acabou se relacionando
com alguns deles e entre eles o Carlos.
Carlos cursava direito. Toda a sua família era de advogados,
juízes, promotores e queriam que ele seguisse o mesmo caminho. Bastante
tradicionalistas e rígidos demais. Mas Carlos não, ele nunca se importou com
nada disso. Gostava de ir para as festas da faculdade, fazia amizades com
todos, era um dos mais populares e um dos mais divertidos. Não tinha ninguém
que não queria ir numa festa que ele ajudava a organizar. As festas do Carlos
eram as melhores. Eu mesma já tinha ido a uma dessas festas antes de conhecer essa
história dos dois.
Ian conheceu o Carlos numa noitada dessas. Beberam, riram
juntos e se tornaram melhores amigos. Iam para os bares da cidade, eles enchiam
a cara e falavam de esportes, faculdade, política e até universos paralelos
entravam nessas noites enlouquecidas.
Um dia Carlos confessou a Ian que estava apaixonado por ele
e que estava bastante confuso com toda aquela situação, nunca tinha pensado
sobre ficar com outro rapaz, sabia que a sua família seria completamente contra
e derrubou sobre o Ian um precipício de sentimentos. O Ian também estava
apaixonado, confessou e por fim se beijaram.
Ano passado o Ian fez a cirurgia que ele tanto queria. Agora
não precisava mais se preocupar em ficar sem camisa por aí. Estava livre do
corpo que não era para ele.
Mês passado foi o casamento dos dois e foi perfeito. Ambos
casaram de terno e na Igreja Católica. O Padre brigou por esse casamento e
disse exatamente: “Não existe lei nenhuma que impeça as pessoas de casarem com
o mesmo traje.” Do lado de fora da Igreja protestos efusivos, lá dentro era
pura luz e amor. A música foi maravilhosa, a festa também.
Eu me tornei uma grande amiga dos dois, saímos juntos,
viajamos, organizamos eventos e nos divertimos demais. Eu também casei, só que
com uma moça e moramos juntas também. Hoje estamos na maternidade esperando o
bebê chegar. O Ian está na sala de parto e o Carlos está com ele para dar
forças. Esse bebê terá pais que se amam muito e é lindo.